[-empyre-] Re: N State and Tropicalia: 'invisible brilliance of life that is not a thing' : Lygia Clark



dear -empyreans-

Regina Pinto, the Brazilian artist and scholar, has been gracious to respond to queries about Lygia Clark, Tropicalia and how this particular kind of 'modernity' is both our antiquity and perhaps an enduring means of production and thought as we deal with our current (N) state. As Lucio Agra has written, "...a rich metaphor that would feed generations onward (like Tropicalism in the 60s)" .

Her remarks are forwarded here; if anyone would like to offer a quick gloss or translation on her text that would be most appreciated !

From: "Regina Pinto" <reginapinto@arteonline.arq.br>
Date: March 27, 2006 11:53:08 AM PST
To: "christina mcphee" <christina112@earthlink.net>
Subject: Lygia Clark



Hello Christina and Ryan,

Thank you so much for your interest in Brazilian art and culture. I would like to send a text in English, but I am very busy these days and the month is finishing and as the month is finishing, this wonderful discussion which I have been lurking as usually is also finishing. I would like to congratulate all the artists and thinkers that were here exchanging ideas. Also I will tell something about Lygia Clark. I quotated this portion of text below, which Christina sent me yesterday:

"Beuys often used the metaphor of the artist as a shaman, the artist as a kind of ultrasensitive intermediary between the people and the cosmos. This required the living presence of the artist. Beuys clearly saw himself as the shaman, the professor, the author, the artist and the performer, despite his expression, "everyone is an artist." Alternately, Oiticica expressed this idea in structures that invited the participation of the public. These would lead not to an individual, but to a communal work of art. Oiticica's "nonrepresive collectivism" and "rap-play" employed communality in terms that explored the finest nuances between individual/solitary reverie and social/communal."

Also Lygia Clark could be described as an artist interested in structures that invited the participation of the public. One of this is "The house is the body", an installation representing a metaphorical journey through a woman's body, a kind of ritual, completed by audience participation, which I am analysing below, in Portuguese . Some of her works seems to be "primitive" rituals and with the relational objects she becomed almost a shaman. (If I have time, I will translate the text below into English, until the end of the month). Here you have two interesting links in English to excellent texts by Suely Rolnik:

http://www1.uol.com.br/bienal/24bienal/nuh/inuhclark02a.htm

http://www.uni-bielefeld.de/IFF/for/projekte/kunstprojekt/english/ referate/rolnik.htm


Here the text in Portuguese, by myself.

Ferreira Gullar [ Um ser novo no universo da arte. Cf. Seção de Documentação do MAM, s/d, s/p, ms.] afirmou que a experiência estética de Lygia Clark não tem paralelo na arte brasileira e nem, que ele soubesse, na arte contemporânea. A vida e a aventura artística de Lygia Clark, estão absolutamente interligadas. A própria artista dizia ser impossível distingüir onde uma começava e a outra acabava, visto que as experiências vividas -- vivências sensoriais, vivências femininas foram sempre o manancial onde se abasteceu a sua criatividade.

A questão principal de Lygia Clark sempre foi o DENTRO e o FORA. Há um texto dela em que afirma que ao abrir um cesto sentiu que a forma externa só existia em relação absoluta com esse vazio - "vazio pleno" e foi aí que se perguntou pela primeira vez se o problema arte e vida não seria um só. E, em toda a obra de Lygia, o dentro e o fora estão sempre presentes e se confundindo. Esse encaixe é sempre pleno, como a integração, embora por vezes conflituosa, da feminilidade e da masculinidade, do privado e do público, do individual e do coletivo, do espírito e do corpo.

Em 1976 a artista fez uma lista dos autores que lhe interessavam e iniciava dizendo que antes lera tudo sobre psicanálise mas que agora estava lendo tudo sobre antropologia, tudo que se relacionasse com o homem no sentido do mito. Não que acreditasse em mitos. O mito para ela seria o próprio ser humano e as suas vivências registradas no corpo. A artista acreditava, isto sim, e de forma bastante profunda, no rito. Um de seus trabalhos: "A Casa é o Corpo", feito dez anos antes dessa afirmação, marca exatamente o início do seu trabalho com o ritual. A nosso ver, foi nessa obra que ela percebeu como poderia utilizar a participação do espectador no sentido de criação coletiva. Até então o espectador participava individualmente, cada um com o seu "Bicho", com o seu "Caminhando" ou com um dos objetos da "Nostalgia do Corpo", ou no máximo em dupla como na "Roupa-Corpo- Roupa". "A Casa é o Corpo" era um túnel-vida lúdico, espécie de trem- fantasma de parques de diversão. Nele, forçosamente, não entraria uma pessoa de cada vez. Lá dentro, elas deveriam partilhar suas emoções. Assim como num parque, o grito da montanha russa escapa em uníssono, o público dentro do labirinto, estimulado por sons, luzes e sensações táteis, deveria quebrar suas barreiras e se comunicar, nesta revivescência do nascimento. Nesta exploração / comunicação no labirinto poético, o público ia descobrindo que a casa é o corpo: articulação do ser e do estar, parede igual a pele. A "Casa é o Corpo", oferecia uma vivência ainda essencialmente psicanalítica, por estar conectada ao nascimento e ao parto mas ao mesmo tempo já se pressentiam nuances antropológicas.

O trabalho de Lygia foi se tornando cada vez mais um exercício experimental para a liberdade. Uma tentativa de desbloqueio do outro, fosse este bloqueio erótico, violento, social ou de comunicação. Com os objetos relacionais a artista chegou a se transformar numa quase curandeira / xamã..

" O Anti-Édipo" de Deleuze-Guattari [ DELEUZE, Giles e GUATTARI, Felix . O Anti-Édipo. Rio de Janeiro, Imago Editora LTDA., 1976, p p. 15-70.] ] tem como subtítulo capitalismo e esquizofrenia e coloca sempre em confronto o poder terapêutico e o poder social e econômico pois, a potência do corpo está sempre no cerne da questão de poder. Em uma de suas inúmeras cartas Lygia Clark afirma estar lendo "O Anti- Édipo". Mero acaso?

O caminho de Lygia Clark na arte foi sempre o de romper com os suportes, começou com a pintura, a pintura perdeu a moldura, virou casulo, caiu ao chão, virou bicho, em seguida o caminhando, um espaço topológico sem dentro nem fora. Segundo o Doutor Luiz Carlos Wanderley Soares, que trabalhou com a artista, ela estaria querendo romper com o suporte da subjetividade. Concordamos com ele. Na "Casa é o Corpo", por exemplo, a viagem termina num espelho deformante, um espelho de parque de diversões, esta imagem deformada corresponderia ao espaço da farsa, o qual Guattari [GUATTARI, Félix e ROLNIK, Sueli. Micropolítica, cartografias do desejo. Petrópolis, Vozes, 1986, ] afirmou ser o espaço apropriado para a invenção de uma subjetividade delirante, a única que num embate com a sujetividade capitalista, a faria desmoronar. Enquanto isto não acontece, cada um de nós continua sendo, para utilizar a linguagem da informática, um terminal individual que consome subjetividade. Subjetividade sempre construída pelo social.

All best,

rcp

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Regina Célia Pinto

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